A infância é um tempo muito importante na constituição de um sujeito, seja em seus aspectos físicos e psíquicos, na formação de hábitos e da estrutura cognitiva. A criança, especialmente na primeira infância, está aberta ao aprendizado, ao conhecimento, inicialmente reproduzindo comportamentos para mais tarde agir conforme seus próprios desejos. Mesmo nesse momento mais tardio podemos perceber que o que lhe foi transmitido e o que a criança conseguiu capturar do outro é base fundamental para suas escolhas, seja na própria infância ou em fases posteriores da vida. Isso não é diferente no que se refere à alimentação.
A obesidade infantil está relacionada a diversos fatores, e iremos considerar aqui algumas relações familiares envolvidas nesse processo, inclusive os hábitos familiares transmitidos à criança. O que chamamos de hábito alimentar refere-se aos costumes da família em relação ao alimento, sua rotina, o que escolhem, como comem, quando comem, o que comem… Isso é o que é possível ver, o que está claro e fácil de se contar ao médico ou nutricionista. Mas existem outras relações com o alimento, que são subjetivas e que estão intimamente ligadas ao afeto que a criança passa a estabelecer com o alimento, e isso envolve a participação dos pais.
Desde a amamentação, o ato de se alimentar está muito atrelado à figura materna e ao amor, ao prazer, ao envolvimento afetivo da figura da mãe (ou responsável) com a criança. Isso se estende pela infância, de maneira a fazer com que a criança entenda pela facilidade que o que é oferecido por aqueles que o amam é bom. O que acontece é que esses pais trazem consigo suas próprias questões subjetivas, seu contexto cultural, e com certeza isso atravessa a relação com seus filhos.
Nos quadros de obesidade infantil, é possível perceber o quanto a estrutura familiar encontra-se fragilizada em controlar a obesidade, seja por considerarem que tem pouco tempo para administrarem melhor a alimentação, seja pela dificuldade da família toda em assumir mudanças importantes, ou ainda pela atitude de recompensa pela comida (guloseimas, lanches, fast foods) que muitos pais assumem para amenizar sua ausência, para atender a demanda das crianças, para cessar uma birra. Assim, a falta que as crianças podem sentir de qualquer coisa que seja, vai sendo ilusoriamente preenchida, e vai dando prazer a quem come e alívio a quem oferece. E, claro, também vai enchendo o corpo da criança.
No campo da alimentação infantil, o não ainda é compreendido com conotação negativa. Mas, ao contrário, dizer não a uma criança para comida é muitas vezes ensiná-la a compreender os limites da saciedade, os limites do consumo e também do prazer, limites que seu próprio corpo precisa para manter-se em equilíbrio, com sensação de bem estar. Mas para que isso aconteça é preciso, antes, que o adulto consiga estabelecer esses limites para si mesmo, e que o não venha sem culpa, com segurança e amor.
Aos pais, nesse momento em que comemoramos a semana da criança, fica um convite… reflitam sobre a importância fundamental que têm na educação alimentar de seus filhos, revejam atitudes e assumam que a mudança é necessária. Com certeza algumas privações são inevitáveis, mas também haverão ganhos que poderão render frutos ao longo da vida.